O livro “Aurora
(morgenröte) - reflexões sobre os preconceitos morais”, publicado em 1881,
segue o estilo aforístico de Nietzsche e apresenta uma transição em sua
filosofia que virá a consagrar-se posteriormente, uma vez que é neste livro que
inicia a criação de novos conceitos que mais tarde virá a culminar à
transvaloração de todos os valores, de modo que é importante para a construção
de elementos filosóficos que posteriormente possibilitou o desenvolvimento de
sua filosofia, o objetivo do autor neste livro fora refletir sobre a origem dos
preconceitos morais e extrair desse pensamento certo desprendimento e
libertação, de maneira a abrir caminho para a moral e a religião ausentes de
preconceitos prejudiciais, como por exemplo, a ideia de que o corpo é inferior
à alma, considerada imortal, e dessa forma abrir caminhos para receber a vida
terrena sem a moralidade transcendente vigente até então no ocidente cristão.
Ao refletir sobre a gênese da moral,
Nietzsche considera que “a moralidade não é outra coisa se não a obediência dos
costumes, sejam eles quais forem”. Em toda parte, toda sociedade ou grupo, onde
a moralidade não manda, ou seja, onde não há influência e mesmo a presença da
moral e também dos costumes, o homem livre, dessa forma, torna-se imoral: ele
quer depender de si mesmo, de seus pensamentos, suas ações e suas consequências,
e não mais de uma tradição estabelecida previamente. Somos nós, Homens do
presente (Homens do futuro como fomos considerados outrora) seres imorais, mais
do que em qualquer outra época: após o advento do cristianismo o mundo
ocidental foi fortemente influenciado pela moral e costumes cristãos, e mais do
que nunca reivindicamos essa moralidade, resultando cada vez mais em pessoas que
abdicam um estilo de vida pautada na
busca de uma realidade transcendente, e buscam, por consequência, uma vida “imoral”
nãos mais abdicando o corpo em nome da alma, mas sim desregrando em sua vida o
que fora outrora considerado um costume seguido por gerações, vivendo plenamente
na terra e renunciando as consequências religiosas advindas de uma vida “imoral”.
Em casos de epidemias, enchentes, tempestades, secas, ou qualquer outro evento
súbito que causa desgraças que abatem uma comunidade, leva a seus membros e
pensarem há uma falta de cumprimentos de costumes ou acreditam que é
necessários criar novos costumes para apaziguar a “ira dos demônios” que abate a população,
levando a falsa ideia de que o problema está sendo resolvido, pois, dessa
forma, cria-se novas superstições e costumes, e afasta-se ao mesmo tempo da
causa real da desgraça que abate um povo, “assim, sob o império da moralidade
dos costumes, o homem despreza primeiramente as casas, depois as consequências,
em terceiro lugar a realidade e liga todos os seus sentimentos elevados (de
veneração, de nobreza, de altivez, de reconhecimento, de amor) a um mundo imaginário: que chama de
mundo superior.
A educação do gênero humano, interpretada
pelo autor como uma educação que fora dirigida até o momento por “carcereiros”
e “carrascos”, leva em pauta que não há educação mais perniciosa do que a que
ensina a ideia de punição, “não há erva daninha mais perigosa” nas palavras do
próprio autor, e com razão. Essa ideia
foi introduzida de forma ousada em nosso processo de educação, não somente
levar a cabo a simples ideia de punição, mas nossas vidas são regradas a partir
dessa ideia, o que leva-nos a interpretar a “causa e efeito” como “causa e
punição”, e como mal em toda a sociedade, até mesmo os atos mais fortuitos
foram interpretados dessa forma, sendo eles privados de sua inocência.
No aforismo de número 30 “crueldade refinada
como virtude” Nietzsche debate sobre como a distinção é como uma crueldade
refinada, no momento em que há a necessidade
de se distinguir, afinal qual é a segunda intenção que dirige essa
necessidade? Queremos que, de alguma forma, nosso “próximo” sinta-se mal, para
baixo, angustiante e que nosso olhar desperte nele um sentimento de inveja, impotência
e desgraça, para que possamos repousar sobre ele nosso mel, enquanto o fazemos degustar esse benefício, e podemos
fita-los, finalmente, com ar de triunfo. O aturo ainda há de nos prevenir a
respeito dessas humildes pessoas levando-nos a observar de um ponto de vista os
que, por sua humildade, nos preparou uma tortura, na intenção de se tornarem triunfantes
a nosso respeito:
“Ele
se mostra compassivo para com os animais e nós o admiramos – mas ele pretende
assim dar livre curso a sua crueldade em relação a certas pessoas. Aí está um grande
artista: a volúpia que degusta antecipadamente, imaginando a inveja dos rivais
subjugados, impediu sua força de adormecer até que se tenha tornado um grande –
quantos momentos amargos não fez pagar a outros espíritos para atingir essa
grandeza!” (Aurora, Editora Escala, página 59).
E para fechar, deixo-vos um trecho de uma
pequena reflexão extraído do livro, intitulado “conhece-te a si mesmo, essa é
toda a ciência”: “Só depois de conhecer todas as coisas é que o homem poderá se
conhecer a si mesmo. De fato as coisas são simplesmente as fronteiras do homem”. (Aurora, Editora Escala, página 76)
AURORA.
ResponderExcluirA aurora é o mais fascinante manto costurado de luzes etéreas, serelepes…
Uma simbiose lírica de magia e de reflexos telúricos.
Extasio-me com a aurora!
Filomena Gomes Camacho.